sábado, 19 de dezembro de 2009

Brisa

Ele gosta de sol, é um arquétipo atemporal
Ele gosta de jogar, é um sedutor
Ele voa sobre seus brinquedos caros
E ninguém sabe de quem ele foge
Nem quando volta pra casa
Agora que finalmente há uma

Ele pode ser qualquer coisa
Você o adoraria de qualquer jeito
Ele é um tesouro sem mapa
Um mistério sem pistas
Fingindo que é tímido
Para disfarçar o orgulho
Fingindo charme
Para disfarçar a melancolia
Você nem notaria a diferença

Ele pode estar em qualquer lugar
Com qualquer pessoa
Mas ele espera por alguém
Que explode sob forma de sonho
nas profundezas do seu olhar sereno

Ele se aventura, ele se perde e se encontra
Ele se esconde e se diverte, ele tropeça
Ele parece criança, ele se assusta fácil
Ele amadureceu, ele aprendeu a seduzir
Qualquer uma, de qualquer cor ou tamanho
Você não saberia dizer quando

Ele passa ao seu lado e você nem repara
Ele arquiteta uma liberdade onde ninguém o alcança
Você não acredita que pode, ainda que deseje
Você não agüentaria os gritos e acenos
Sentir o olhar sereno se inquietando
com tantas cores e perfumes e formas
Você o ignoraria se pudesse, para seu próprio bem
Ele sabe e segue veloz, com os cabelos ao vento

quinta-feira, 17 de dezembro de 2009

SOLIDÃO




Ela sai, tranca a porta. Fecha o sobretudo preto. No hall do prédio velho e triste com cheiro de naftalina, ela espera o elevador enquanto olha os sapatos vermelhos. Naquele frio, o cobertor chamava de volta para o apartamento.

Rua. Sujeira, cheiro de frango assando, mofo do sebo da esquina. O sapato toc-toc no asfalto. Buzina. Morar num bairro pobre é triste e sujo e bonito. Olha aquele mendigo dormindo... Comeu marmita da Igreja. Ponto de ônibus, ela se aconchega do vento dentro do sobretudo. Um casal briga baixinho: ela negra, ele branco. Uma senhora com sacolas respira fundo. Passam ônibus, um, dois, cinco, nenhum é o dela.

Senta na janela. Abre um livro, mas o sono bate. Melhor observar. O rapaz ao seu lado batuca um samba que só ele escuta em fones minúsculos. Um homem finge dormir no banco preferencial assim que uma grávida entra no ônibus. O cobrador deixa uma senhora que fala sozinha descer sem pagar a passagem. Cada um se isola a seu modo.

Cidade grande e perdida, as pessoas na rua passam, casacos, gorros, luvas, as janelas dos carros embaçam com a fina chuva que cai mansamente. Suja e brilhante, cheiros podres e doces, shampoo e lixo.

Rua, chuva. Ela não se apressa, deixa a água encharcar seus cabelos. Os sapatos toc-splash-toc no asfalto molhado. Cada passo uma sentença. Ela chega à porta descascada e toca a campainha. Ele abre. Ela entra.