quinta-feira, 11 de outubro de 2007

Cartas na mesa



Ei, eu me lembro de você.

Eu me lembro de você. Lembro de você atravessando a calçada e me sorrindo. Lembro do seu cigarro e do seu chiclete de menta, e do sopro do fumo que você soltava rindo. Quando a gente andou entre aqueles prédios, eu lembro de você ter dito que queria um café. E a gente se enfiou num cubículo qualquer cheio de poltronas, nos entregando a uma conversa cafeinada e sincera. Eu me lembro quando você ficava uma fera.
E a gente imaginava festas e grandes eventos sociais que poderiam rolar desde pracinhas desertas a museus nacionais. A gente tinha tantas idéias!
Sim, eu me lembro de você. Dos dois primeiros botões de camisa que você nunca abotoava, das mesas que você riscava, da tatuagem que você nunca fez. Eu me lembro!
Eu me lembro de nós dois embaixo da chuva, andando encharcados, porque correr não adiantava mais. Eu me lembro de nós dois nos despedindo e você olhando para trás.
Quando você apontava um passarinho na rua, eu sempre olhava rindo. Porque você gostava dos gatos pretos e queria adotá-los todos. Porque você sempre foi você.

Sim, eu me lembro daquele dia em que você me ligou, e num momento , tudo se apagou. Você disse , no bocal do telefone, que ninguém gostava de você. Que você era sem graça. Que você era substituível. Você disse : "Eu sempre te contei coisas e nem sei se você gostou. Acho que é só por educação que você sorri. Você é a pessoa que eu perdi."

Ah, eu queria te mostrar o livro do Tempo, o livro da Verdade Infinita e Incontestável para te mostrar que quando você chorava, eu chorei, o que você amou , eu amei, e quando você contava piadas, eu ri , rindo as risadas mais sinceras e escancaradas. Pela sua alegria eu ri . Pelo chiclete, pela chuva e pela sua xícara de café , eu sempre, sempre ri.

quarta-feira, 10 de outubro de 2007

Os ideais não mudam

Ontem, numa aula de ciência política, eu ouvi do meu professor que nós estamos numa faculdade de direito pra aprender a ter opiniões bem fundamentadas, e também para mudar de opiniões.

Uma aluna ousou discordar dele e disse que jamais mudaria sua visão política, e ele insistiu que assim não se era completo, que deveria se estar apto a mudar sua visão no momento em que se visse que ela não era a correta.

Como assim “correta”?! São os ideais da pessoa, não é um texto que vai fazê-la mudá-los, por mais embasado e convincente que seja este texto.

No momento em que tu solidifica teus ideais eles são pra vida toda, afinal são teus ideais, são as coisas em que tu acredita, é a tua opinião sobre determinado assunto, isso não muda simplesmente por ter lido algo bem fundamentado.

Recentemente tive a oportunidade de ler ‘O caso dos exploradores de cavernas’ onde cinco juizes dão seus votos sobre a condenação ou não dos espeleólogos por terem cometido homicídio e comido a carne do que foi morto, para sobreviver. Desde antes de ler o livro eu já sabia sobre o que se tratava, e eu já tinha uma opinião formada, de que os exploradores jamais deveriam ser considerados culpados, afinal eles estavam numa situação de vida ou morte, era uma situação adversa, onde não valem as leis de onde tu mora e sim as leis naturais que tu mesmo cria através de contratos firmados. É a lei da natureza, é o que se chama de direito natural, jusnaturalismo.

Ler o livro só me fez ter uma opinião mais fundamentada, e nisso eu concordo com o professor, estamos cursando esta faculdade para que possamos ter base para que nossos argumentos sejam bons, mas apesar de ter visto dois votos e meio contrários a posição que eu aceito como correta, e estes votos eram muito bem fundamentados e inclusive criticavam – e muito – o voto que eu aceitei como o que mais se encaixava com o meu pensamento, em momento algum eu pensei em mudar de opinião, por mais criticada que ela tenha sido durante o livro inteiro, afinal é a minha opinião, é o que eu penso sobre o assunto, isso não muda simplesmente lendo uma opinião contrária, porque não há nada que prove que a minha opinião está incorreta, apesar dos argumentos usados para tentar provar que o voto do juiz com o qual me identifiquei era mal embasado.

Ideais não mudam, e se mudam é porque a pessoa tem a cabeça muito fraca.

domingo, 7 de outubro de 2007

Transgredindo e vivendo


Logo que nascemos, damos o primeiro choro que marca o início de nossas vidas fora do útero materno, e sem sabermos somos automaticamente inseridos numa série de regras e convenções sociais que todos seguem, muitos sem nunca questionar ou se perguntar a razão de existirem. Talvez se nascêssemos com a consciência deste fato nosso choro seria mais doloroso e prolongado.
Não comer biscoito antes do almoço, dormir antes das 22 horas, não responder pai e mãe, ir para escola, estudar para prova para passar de ano, acreditar numa religião, votar obrigatoriamente nas eleições, fazer vestibular, trabalhar, casar e formar uma família... Vamos seguindo nossas vidas num curso que a sociedade prega ser o correto e muitas vezes sofremos e nos esforçamos para alcançar algo que nem ao menos sabemos se é o que queremos para nós mesmos. No entanto, toda essa alienação social proporciona uma das sensações mais maravilhosas que podem ser experimentadas em vida: romper as regras.
É algo completamente satisfatório e pleno, que melhor traduz o estado de liberdade e para poder vivenciar esses momentos toda uma vida pode ser justificada. A diretora mala do colégio fala que é errado, a Bíblia condena, geralmente existe alguma forma de castigo implicado no processo, mas isso tudo torna o ato de transgredir ainda mais emocionante e satisfatório. É o nosso ser, nossa vontade se manifestando acima de qualquer obstáculo, uma prova que conseguimos alcançar a felicidade se não nos reprimirmos e mantermos a mente aberta.
Em tempo: tenho vontade de quebrar com um soco o vidro que dispara o alarme de incêndio do prédio, de roubar o DVD que está tão caro na loja, de sair do bar sem pagar a conta, de ir para a aula de pediatria bêbado, de passar com um trator por cima de todos os carros no engarrafamento, de casar sob o som de “Sympathy for the Devil” dos Stones. Tudo isso pode parecer estúpido ou desnecessário, mas quebra a rotina, renova o destino, uma forma de arte em forma de ações.
Essa força é o que inspira as crianças a mentir, os alunos a colar, os padres a transar, os políticos a roubar, os rockstars a se drogar, as esposas a trair, enfim, um tempero essencial para nossas vidas.